quinta-feira, 30 de abril de 2009

A Gavigralha


Essa história é do meu irmão João Pedro, ele tem 13 anos e ficou escrevendo para não precisar me ajudar lavar a louça. A idéia inicial (de acordo com o autor) era um gavião, mas sabe que a Gralha ficou muito mais punk... Que gavião o caralho!


A Gavigralha


Alguns dias depois de nascer já se tornara órfão. Quando crescido resolveu voar, descobrir aventuras e viver a vida livre, mas queria levar sua amiga árvore, que o criou desde quando nasceu.

Sabendo que ele era órfão a árvore o criou como um filho e contava histórias que aconteceram com ela, pelo menos as que estavam ao seu alcance. Essa árvore era um pinheiro que como todo pinheiro tinha como seus frutos pinhões, sendo que essa ave era uma gralha azul. Ela lhe contava que um dia ele iria voar para longe e descobrir coisas incríveis jamais descobertas e um dia iria abandoná-la, mas levaria um pedaço dela com ele.


Certo dia a árvore afugentou o pássaro de seus galhos dizendo para ele voar o mais rápido possível sem olhar para trás, o pássaro seguiu as ordens. E em tal período de seu vôo, com um gesto rápido olhou para trás e viu muita fumaça, fazendo meia volta voou com todas as suas forças em direção da árvore, chegando perto viu que ela estava em chamas. Tentou conversar com ela, mas ela não respondia. Então, um leve e fino som lhe disse para pegar um pinhão e levá-lo o mais longe possível e plantá-lo, ele com um gesto triste e sem jeito pegou um pinhão ao seu lado e voou com todas as forças, deixando para trás a sua amiga. Suas lágrimas escorriam pelo seu rosto, caiam no ar, e pouco a pouco evaporavam. Após ter plantado o pinhão ele voou em busca da felicidade.


Anos depois do acontecimento ele voltou ao mesmo lugar onde plantara o pinhão, chegando lá se surpreendeu, pois onde estava o pinhão já se encontrava um lindo brotinho. Aí, a gralha entendeu porque sua amiga disse que ele levaria um pedaço dela, ele entendeu que tudo recomeçaria, que o pinhão carregava uma nova vida, um novo começo. Sendo assim, a galha voou e nunca mais voltou, ninguém sabe o que aconteceu com ela, o pinheiro provavelmente ainda deve estar firme e forte, ninguém sabe onde e qual é a árvore mas pode ser qualquer uma.

*Quer dizer que o negócio é só voar em busca da felicidade?

Então, é fácil...

.

.

imagem:Hylton Warburton

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Insônia


Gripe suína, febre aviária.

Burrice humana mesmo.


Faixa de Gaza,

Copa do mundo,

Combustíveis alternativos,

Fast-food,

Déficit,

Democracia,

Solidão,

Pressão alta,

Pressão baixa,

Superávit,

Pizza da Paz,

Taxa de juros,

Colesterol bom,

Colesterol ruim.

CO2,

Preservação,

África negra,

Violência urbana,

Celulite.


Super população,

Congestionamento,

Extinção.

.

.

Imagem: http://niilismo.net/galeria

sábado, 25 de abril de 2009

Notícias de Madagascar


Definitivamente tem coisas que não consigo descobrir até que ponto me fazem bem e quando é que começam a me prejudicar...
Sim, pode ser preocupação, pode ser amor, pode ser sei lá o que, ou só curiosidade exacerbada. Mas esse negócio de todo mundo ficar me perguntando se vou casar ou comprar uma bicicleta encheu o saco tudo que podia, a partir de agora parto para ignorância, o primeiro que fizer pergunta similar vai receber como resposta que vou virar puta... sim PUTA. Puta como o Sarney, como a famosa e não sei se real Ilda Furacão (Enfim o que é real?), puta, puta.

O hospital que eu nasci virou um hotel... ainda não formei opinião a respeito.

Até porque tudo o que eu sei é que acharei ovos de dinossauro, mas céus, eles não entendem nada de ovos de dinossauros, se eu falar isso me acusarão de louca, aqueles desinformados sobre dinossauros e seus ovos.

Eu tento não ser cruel.
Eu tento calar a boca.
Juro que tento.

Então, lá pelas tantas da madrugada, em um lugar longínquo e quase alienígena para mim, me traio. Falo o que penso, digo que não acredito e mando tudo à merda:
- Senhoras e senhores vão à merda!
(Tenho impressão de já ter escrito isso por aqui.)

Melhor, fiquem aí mesmo, no mesmo lugar de cem anos atrás, EU ME VOU, eu já fui há muitos anos. E só estou me incomodando mesmo por causa da época do ano, essa semana de abril, esse vento que vem a cavalo, e esse redemoinhos de poeira, não sei porque tudo isso me deixa sensível.

Sinto saudades, sempre tenho saudades, não das convenções, regras, padrões e normas, não da “falta” do que ler para ter o que pensar e depois o que dizer, não da parte podre, isso encontro sem cessar, sinto falta das pessoas que amo. E embora quando as olhe sinta pesar pela escravidão que vejo – a qual julgo ser maior que a minha-, é simultaneamente, uma escolha individual, na qual não tenho direito de intervir e nem desmerecer.

(Me perdoem às vezes eu julgo... )

Por isso parti, para não me adaptar...

E quanto a saudade? Bem, é uma angústia incurável em alguns casos mais acentuada. Porque sim, é possível sentir saudades o tempo todo e nem saber do que é que se tem saudades, porque é perfeitamente cabível estranhar o que não se conhece. Assim, dessa forma, em alguns casos ela tortura, mas como já disse não há o que fazer, não tem cura.
.

.

Imagem: Georges Seurat

domingo, 19 de abril de 2009

Imaterial


Era uma vez um ser feito de bruma (porque não quero que meu personagem seja um homem ou mulher, nem um animal, inseto ou passarinho) esse ser como era de bruma vagava em um amanhecer eterno. Passava por todos os lugares, mas somente muito cedo, ele nunca parava, e acabava não vendo muitas coisas, perdia os detalhes, os períodos de maturação.


Via tudo e não via nada. Tudo tinha e não tinha nada. Cheio de conhecimento e tão desconhecedor. Ia a uma velocidade muito rápida para o amor, para apegar-se a outra coisa que não fossem as manhãs gélidas do inverno de frente para o Reno, as Pirâmides ao alvorecer, amava os lugares, mas não amava ninguém.


E o ser feito de bruma era feliz, porque geralmente os seres feitos de bruma são felizes. Ele viu, vê e sabe que verá muita coisa cruel, sim, por quanto passava em sua interminável correria, mas sabia dosar sua quantidade de altruísmo, era um ser feito de bruma feliz e equilibrado.


Um dia o ser feito de bruma,sem perceber,carregou junto em sua bruma uma folha de laranjeira que havia caído a esmo. Sem saber por que passou a sentir saudades, ele nem sabia o que era isso, até então nunca havia sofrido. Pensava sem cessar num campo com cheiro capim, todo verde, na terra escura, no laranjal, quase podia sentir o pólen minúsculo que se alastrava na época de floração das árvores, queria estar lá. Acontece que assim como chegou a folha novamente caiu, caiu da bruma e ficou no caminho. Acabou a saudade. O ser feito de bruma era novamente um ser tranqüilo, veloz, mas tranqüilo.


Certa ocasião uma lebre passou correndo através dele, com que deleite sentiu aqueles pêlos brancos e macios acariciarem seu vazio, o pequeno mamífero entrou na toca e o ser feito de bruma o seguiu. Encheu de bruma toda a toca do animal, viu seu ninho, seus filhotes e foi embora. Outra vez, seguiu um garoto de bicicleta, aquela risada alta e alegre, aqueles cabelinhos morenos, foi impossível se afastar. Acompanhou-o por várias ruas até sua escola, e quando o garoto ultrapassou a porta ele não parou, invadiu toda a escola, o saguão, as salas de aula, as quadras de esporte, o refeitório. E ali havia dúzias daquelas criaturinhas místicas, o ser feito de bruma ficou encantado. Porém, precisou partir quando a bruma começou a tornar-se tão espessa que as crianças começaram a chorar de medo do desconhecido.


O ser feito de bruma, fazia essas coisas de seres feitos de bruma. Quando deparava com algo que lhe chamava atenção ia atrás, observando, sentindo o cheiro e quando esquecia o que mesmo estava fazendo ali partia sem nenhum sentimento. Os seres feitos de bruma duram séculos, e muito antes dos homens aparecerem na face da Terra eles já estavam aqui. Eles não tem preocupações com a existência de deus, com a conta do telefone, ou com o futuro. Eles alimentam-se de umidade porque de bruma são. E quando morrem no lugar da bruma surge uma campo de tulipas que percorre quilômetros, quilômetros e quilômetros. A quem diga que a Holanda é um grande cemitério de seres feitos de bruma. De minha parte não posso concordar, pois nunca fui até a Holanda.


É possível que sua vida acabe sem ao menos você ter cruzado com um ser feito de bruma, lembre-se eles só podem ser vistos na alvorada, quando você ainda dorme. E a sorte de estar no trajeto de um deles não será veraz a menos que ele o julgue interessante, do contrario sua passagem será muito acelerada para que você possa percebê-lo.

.

.

imagem: Naoto Hattori

A Coruja de Ouro


Ele estava vivo e toda aquela história sobre o vazamento no cano era passado. Precisamente em um pedaço qualquer do mundo sentou para descansar. Como tudo é tão engraçado, tão tragicômica essa vida foi exatamente o que pensou.


Podia ouvir, ali do lado de fora da casa, do lado de fora do mundo, uma coruja, grilos e uns 25 cachorros. Pensou como seria se fosse uma coruja. Primeiro na cor, teria a cor do ouro, uma coruja dourada que bela seria, que voa a noite despercebida e resplandece a luz da Lua.


Riu de si mesmo. Deve estar querendo virar estrela da TV, ser o centro das atenções mundanas, imundas e inocentes. Ou não, é apenas sua pseudo-alma (porque ele não acredita em almas no sentido espiritual) espalhafatosa querendo vir à tona.


Sentir frio talvez não fosse tão ruim. Ele que sempre fora tão friorento certamente seria uma coruja sensível. Poderia ser uma coruja de terras escaldantes, iria morar na praia, quem sabe fazer surf e andar de camelo.


Mas a cor seria a mesma... cor de ouro de filme.

Pensou em uma coruja piando Bethoven, mas corujas não piam, o que fazem mesmo? Não lembrou. Não faz diferença, elas acabam cantando, Bethoven talvez não, quem sabe Verdi ou Mozart. Pensou quão triste deve ser uma coruja muda e quão surda deve ser uma coruja surda. Teve até vontade de chorar.

Teria muitos ninhos isso sim, nos lugares mais altos e longínquos, em árvores, nas montanhas, nas brechas, em telhados de casas abandonadas, no meio do mar em uma rocha, em um vulcão extinto, perto de uma tribo de canibais. Todos os ninhos seriam suas casas e nenhum sua prisão.


Até qual altura as corujas podem voar? Até onde vai o céu? Quão selvagem pode ser uma coruja? São animais solitários não? Tem garras assustadoras não? Um grande bico afiado também?


Mas sua vida de não coruja exigia agora que fosse dormir, para acordar cedo, para trabalhar antes mesmo de despertar. Foi para o quarto, pegou no sono e sonhou que era uma coruja dourada até a manhã seguinte.

.

.

imagem: Georges Seurat

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Você


Tem sido difícil.
Essa vida que levo me machuca todo dia um pouco.
Tudo que tenho que fazer porque preciso, mas não quero.
Tudo que tenho que obedecer sem concordar.
Todos os sorrisos que tenho que dar.
Tudo que eu aceito por conveniência e comodismo.
Tudo ao que me apeguei sem precisar.
Todo esse sistema de merda que não consigo deixar.


Tenho andado doente.
Eu sofro.
Meu corpo padece.
Você parece morar ai do outro lado da linha.
Eu vejo você numa ilha ensolarada.
E quero ir correndo pra lá.
Como você tem a cura para esse mal?
O que você descobriu que não sei?
Como não foi corrompido em um planeta onde tudo o consumismo parece contaminar?

Sabe, quando olho nos seus olhos parece que vejo um caminho.
E QUERO IR CORRENDO PRA LÁ.


Confesso sou covarde, tão covarde...
Fico parada.
E me confundo.
Você sou eu?
Você é eu?
Você é um pedaço meu?


Não.
Você tem um nome, um cheiro, uma voz, e beijos que fazem dessa droga toda eu me livrar.
Você tem um jeito, uma coisa de terra, de simples e fascinante, pareço plástico se for comparar.
Mesmo assim...
Me deixa fazer parte?
Eu quero ser junto com você.
Você é minha cura?
(A que procurei dentro de mim e nunca achei. Não achei porque estava em você, um pedaço meu que me falta e está por aí a passear...)
Você sou eu?
Eu sou você?
E eu inventei uma história de amor pra disfarçar?
.
.
.
imagem:Jean Beraud